Novas regras ambientais para imóveis rurais impostas pela Corregedoria Geral de Justiça
Em dezembro de 2023, a Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo – CGJ/SP publicou o Provimento CG 25/23, que dispôs sobre a averbação do cadastro ambiental rural – CAR pelos Oficiais de Registro de Imóveis e alterou o capítulo XX das normas da CGJ a fim de padronizar a qualificação registral nos casos de dispensa de Reserva Legal, previstos nos artigos 67 e 68 do Código Florestal (lei 12.651/12).
Apesar da tentativa da CGJ de padronizar a qualificação registral nos casos de dispensa de Reserva Legal, ainda não é fácil interpretá-las à luz da legislação ambiental vigente.
As exigências da CGJ sobre a averbação do CAR não têm fundamento legal, porquanto o artigo 18, § 4º, da lei 12.651/12 desobriga a averbação da área de Reserva Legal na matrícula do imóvel (cf. GRUPPI, B. D.; SUPPIA, M. C. As exigências ilegais do cadastro ambiental rural nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça – NSCGJ. Migalhas, 1º de abril de 20221). Portanto, as normas da CGJ são fruto de voluntarismo, cujos provimentos e decisões são cada vez mais complicados (cf. TJ/SP; Recurso Administrativo 1003174-20.2022.8.26.0037; Órgão julgador: CGJ; Data do julgamento: 27/10/23).
Em que fundamento legal está previsto, além das normas de serviço da CGJ, que a averbação da inscrição no CAR é exigível?
Apesar dessa dificuldade, o dr. Narciso Orlandi Neto criou um a passo e passo para interpretá-las, considerando as normas revogadas pelo Provimento CG 25/23, que tratam do tema (itens 123 e seguintes do Capítulo XX, Tomo II, das NSCGJ):
123. Poderão ser averbados: I – os termos de responsabilidade de preservação de reserva legal e outros termos de compromisso relacionados à regularidade ambiental do imóvel, emitidos pelo órgão ambiental competente; II – o número de inscrição no cadastro ambiental rural, enquanto não decorrido o prazo estabelecido no § 3.º do art. 29 da lei 12.651, de 25 de maio de 2012, a partir do qual a averbação passará a ser obrigatória; III – a informação de adesão do interessado ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) de posses e propriedades rurais.;
Houve apenas atualização do texto anterior.
O curioso é que, no inciso II, a Corregedoria reconhece que, pela lei, a averbação só será obrigatória quando decorrido o prazo previsto no § 3º, do art. 29, do Código Florestal. Só não considerou que esse prazo passou a ser indeterminado (art. 29, § 3º, do Código Florestal), porque o dispositivo foi modificado. Isso quer dizer que, se não há prazo, a inscrição não pode ser exigida para determinadas situações.
123.1. A averbação do número de inscrição no cadastro ambiental rural (inciso I do item 123) será realizada: I – mediante provocação de qualquer pessoa; ou II – de ofício pelo Oficial de Registro de Imóveis, sem cobrança de emolumentos, quando do primeiro registro, assim que estiverem implantados os mecanismos de fluxo de informações com o órgão ambiental competente, por meio do Serviço de Registro Eletrônico de Imóveis – SREI.
Foram fundidos os antigos 123.1 e 123.1.1, com atualização do último.
123.2. Não é necessária a coincidência e total identidade entre a matrícula e o cadastro ambiental rural.
Foi mantida apenas a parte final do revogado item 123.1.4. Foram revogados os subitens 123.1.2; 123.1.3 e 123.1.4
123.1.3. Na hipótese de compensação de Reserva Legal, a notícia deverá ser averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos após a homologação ou aprovação do órgão ambiental através do Sistema Paulista de Cadastro Ambiental Rural – SICAR-SP.
123.1.4. O conceito de imóvel para fins de Cadastro Ambiental Rural (CAR/SICAR-SP), obedece ao disposto na IN 2, de 5 de maio de 2014, do Ministério de Meio Ambiente; e lei 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, inciso I, art. 4º, não sendo obrigatória a coincidência e total identidade entre a matrícula imobiliária e o Cadastro Ambiental Rural (SICAR-SP).
123.3. Salvo se realizado o averbamento de que trata o inciso I do item 123, e ainda antes do decurso do prazo do § 3º do art. 29 da lei 12.651, de 25 de maio de 2012, a averbação do cadastro ambiental rural condiciona: I – as retificações do registro, os desmembramentos, as unificações, e outros atos de registro ou averbamento que modifiquem a figura geodésica dos imóveis; e II – o registro de servidões de passagem.
É o antigo 123.2. Foi suprimida a parte que confessava a ilegalidade: “[…] mesmo antes de tornada obrigatória a averbação do número de inscrição do imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural – CAR […]”
O importante é que continua obrigatória a exigência de inscrição do imóvel no CAR, nas mesmas situações.
123.4. A averbação da reserva legal florestal será feita de ofício pelo Oficial do Registro de Imóveis, sem cobrança de emolumentos, assim que o perímetro da reserva for validado pela autoridade ambiental e quando estiverem implantados os mecanismos de fluxo de informações com o órgão ambiental competente, por meio do SREI.
É o antigo 123.1.2. Só se alterou a redação. Trata-se de norma programática, da qual apenas se extrai que não há obrigação de o proprietário providenciar a averbação da reserva legal no Registro de Imóveis. O oficial não pode exigir averbação de reserva legal.
123.5. A notícia de compensação de reserva legal deverá ser averbada na matrícula de todos os imóveis afetados, após a homologação ou aprovação pelo órgão ambiental competente.
É o antigo 123.1.3, com outra redação. Nada mudou. A hipótese é da servidão ambiental, que deve ser averbada nas matrículas dos imóveis serviente e dominante.
O problema é que o CAR não foi totalmente implementado e o Sistema não tem analisado nem aprovado as compensações ambientais. O recibo do CAR e o demonstrativo de áreas não mostram compensação ambiental. Então, por enquanto, parece impossível averbar-se compensação ambiental.
123.6. Nos casos previstos nos incisos I e II do subitem 123.3, o Oficial de Registro de Imóveis, à vista do número de inscrição no cadastro ambiental rural, deverá verificar se foi feita a especialização da reserva legal florestal aprovada em conformidade com o Demonstrativo da Situação das Informações Declaradas, qualificando negativamente o título em caso contrário.
Disposição semelhante estava no antigo 123.2.1.
Houve modificação importante. A norma antiga exigia que o oficial apenas verificasse se a reserva legal tinha sido especializada no CAR:
Agora, o item 123.6 exige que o oficial verifique “se foi feita a especialização da reserva legal florestal aprovada em conformidade com o Demonstrativo da Situação das Informações Declaradas …”. Entretanto, não há a exigência de apresentação de planta e memorial descritivo com a indicação da área de preservação permanente e da área reserva legal. A verificação da especialização da reserva legal deve ser feita com base no CAR e demonstrativo e via Sistema do CAR.
123.7. Caso o Demonstrativo da Situação das Informações Declaradas, emitido pela Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, mediante o Sistema de Cadastro Ambiental Rural – SICAR/SP, ateste no item “Dados do Imóvel” a condição “Analisado” e traga no item “Reserva Legal” a situação “Aprovada”, correspondendo a 0 hectare, indicando assim a dispensa da reserva legal por enquadramento nos artigos 67 e 68 da lei 12.651, de 25 de maio de 2012, não será obrigatória, para nenhum efeito, a averbação de que tratam os subitens 123.4 e 123.6 deste capítulo, mas a notícia da dispensa constará do averbamento previsto no inciso II do item 123.
É uma norma nova, que complementa a 123.6. Faz parte da verificação que o oficial deve fazer quando da averbação da inscrição no CAR. Prevê que, em determinada situação, mostrada pelo cadastro no CAR, a reserva legal não será averbada futuramente. Essa situação constará da averbação da inscrição do imóvel no CAR.
123.8. A averbação referida no inciso III do item 123 será realizada: I – mediante provocação de qualquer pessoa; II – por iniciativa do órgão ambiental competente.
Esse é o antigo 123.3. Apenas substituiu a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo pelo “órgão ambiental competente”.
O inciso III, do item 123, trata da averbação da “informação de adesão do interessado ao Programa de Regularização Ambiental – PRA de posses e propriedades rurais.”
Em resumo, conclui-se que o citado provimento não trouxe nenhuma modificação substancial do que já dispunham as NSCGJ.
Assim, entende-se que o Oficial de Registro de Imóveis deveria exigir do proprietário rural o recibo atual do CAR e o respectivo demonstrativo de áreas emitido pelo Sistema de Cadastro Rural Ambiental do Estado de São Paulo – SICAR-SP com a indicação da área de Reserva Legal do imóvel rural.
Caso positivo, a exigência estará cumprida, ainda que não tenha sido indicada a área de reserva legal exigida pelo Código Florestal (20%).
Caso não haja a indicação da área de Reserva Legal, o Oficial de Registro deve verificar se imóvel se enquadra nas hipóteses previstas nos artigos 67 e 68 do Código Florestal, com base no CAR, no demonstrativo de áreas e no Certificado de Cadastro do Imóvel Rural – CCIR. (item 123.7).
Art. 67. Nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 módulos fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo.
Art. 68. Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais de Reserva Legal previstos pela legislação em vigor à época em que ocorreu a supressão são dispensados de promover a recomposição, compensação ou regeneração para os percentuais exigidos nesta lei.
Alternativamente, o Oficial de Registro de Imóveis pode solicitar também uma declaração do proprietário sobre a dispensa da reserva legal, prevista na Nota Técnica Conjunta ARISP | SMA | CETESB.
É importante ressaltar que, por ora, não há como exigir ainda a aprovação ou análise do CAR dos proprietários rurais, pois, depois de 11 anos da criação do CAR pelo Código Florestal, apenas 5% das propriedades rurais inscritas no CAR-SP foram aprovadas pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento responsável pela gestão do CAR (decreto estadual 66.417/21), conforme último Boletim Informativo do CAR – outubro/23, publicado pelo Ministério do Meio Ambienta e Mudança Climática.
Para mais informações, procure o Drumond Advogados, no endereço eletrônico: contato@drumondadvogados.com.br ou pelo telefone no número (11) 3107-9250.
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